sexta-feira, 19 de março de 2010

Novos Símbolos de Brasília



  • Banana, cortesia de Sua Excelência Paulo Roriz, Deputado Distrital, aos cidadãos que ousam manifestar-se durante as sessões da Câmara Legislativa do DF.
  • Panetone, presente de Sua Excelência José Roberto Arruda, ex-Governador cassado e preso. Arruda foi aquele do painel eletrônico do Senado, que jurou pelos filhos, voltou atrás, chorou e pediu perdão; e quando, posteriormente, apanhado recebendo pacotes de dinheiro, disse que era para comprar panetone para os pobres, pediu perdão novamente mas nem colou.
  • Bezerra, ato administrativo de Sua Excelência o ex-Governador Joaquim Roriz, que prometeu e nem deu lotes pra quem transferisse o título de eleitor para Brasília e votasse nele; e que renunciou ao mandato de Senador para não ser cassado após flagra de partilha de R$ 2,2 milhões do BRB para comprar uma bezerra. Atualmente dá lição de moral na TV.
  • Meia, ato administrativo de Sua Excelência Leonardo Prudente, ex-Presidente da Câmara Legislativa do Distrito Federal, expulso do partido e preso. Representa os demais símbolos de transferência de renda da Câmara, como a Bolsa da Véia, a Cueca do Empresário e a Oração da Propina.

quarta-feira, 17 de março de 2010

Judiciário e Justiça no Brasil

Josias de Souza, blogueiro e colunista da Folha de S. Paulo, falou pouco e disse tudo. Tão ou mais importante que a prisão dos corruptos do panetone de Brasília é o inesperado e surpreendente salto qualitativo no desempenho do Judiciário, que, quando quer, trabalha.

Claro que não estou-me referindo ao judiciário local, que permaneceu deitado em berço esplêndido durante toda a crise. Sem a iniciativa do STJ, ainda estaria tudo como dantes.

Vamos esperar que os Judiciários Brasileiros sigam o exemplo do STJ e arregacem as mangas, a fim de valerem o muito sal que comem.

Para ouvir o podcast de Josias de Souza no servidor da Folha Online, clique aqui.

terça-feira, 16 de março de 2010

A Besta faminta

Prendeu-se o governador do DF, por tentar subornar uma testemunha de sua improbidade. Para sucedê-lo no governo, a regra impunha o Presidente da Câmara Legislativa do DF, Deputado Leonardo Prudente, aquele do dinheiro na meia. Embora também preso, o Deputado quis assumir. Não foi permitido. Assumiu então o vice-Governador, Paulo Octavio, apenas para renunciar em seguida, diante da pressão popular, revoltada com as suspeitas que o cercam. Acéfala, a Câmara Legislativa elegeu novo presidente, o qual, automaticamente, passou a ser o novo governador, iniciando imediatamente uma maratona de contratações de correligionários, à fantástica velocidade média de DUAS CONTRATAÇÕES SEM CONCURSO POR HORA, segundo reportagem da Folha de S. Paulo.

Outra reportagem da Folha informa:
"Um dos sete integrantes do TRE (Tribunal Regional Eleitoral) do Distrito Federal, que vai analisar no fim da tarde de hoje o pedido de cassação do governador afastado e preso, José Roberto Arruda (sem partido), já fez parte do governo do ex-democrata.

Em janeiro de 2007, antes de chegar ao tribunal, o jurista Raul Sabóia foi nomeado por Arruda para ser chefe da Procuradoria Jurídica da Caesb (Companhia de Saneamento Ambiental) e, em agosto de 2008, foi empossado no TRE. Segundo interlocutores, Sabóia também trabalhou na campanha de Arruda ao governo local em 2006.

Sabóia afirmou à Folha Online que pretender participar do julgamento no qual o TRE vai decidir se Arruda deve ou não perder o mandato por ter deixado o DEM, após as denúncias do esquema de arrecadação e pagamento de propina.

Questionado se sentia à vontade para participar do julgamento, o desembargador avisou que não daria entrevista. 'Eu vou participar deste julgamento. Agora, não vou dar entrevista'." (Folha Online, 17/03/2010)".


O Distrito Federal é governado por uma eficiente organização que, infelizmente, não tem como prioridade o interesse público. Age em benefício próprio e sob a forma de uma vasta rede de autoproteção e, pelo que é divulgado nos jornais, possui ramificações e seguidores mais ou menos fiéis em todos os poderes constituídos, em todos os escalões. Seu habitat são os gabinetes de portas fechadas, as licitações, as repactuações e prorrogações contratuais, as nomeações e as campanhas. Ela alimenta-se da falta de medicamentos, da falta de leitos e do atendimento desumano nos hospitais públicos; bebe na perpétua carência de recursos do ensino primário e médio; respira o ar tóxico do crime solto nas ruas graças à indulgência estendida também ao criminoso sem colarinho; e cospe cinismo e ironia no prato onde comeu.

Corta-se-lhe uma cabeça e surgem várias no lugar, todas vorazes e venenosas, petrificando a tudo e a todos com o fausto ostentado à custa das vidas ceifadas por falta de hospital, de escola e de segurança pública.

A única maneira de abater-se uma tal besta é negar-lhe alimento, bebida e ar. A maneira de negar-lhe tudo isso é jogar luz sobre os recônditos subterrâneos onde vive o seu coração -- o coração coletivo dos homens sórdidos que, com o tempo, usurparam, lenta, segura e inexoravelmente, o lugar dos homens públicos.

Entretanto, tomar-lhe o prato não é tarefa destituída de riscos pessoais: sua vingança contra o cavaleiro solitário será temível, célere e executada com o máximo rigor da Lei.

O corpo amorfo da massa de contribuintes que acredita no contrato social precisa tomar forma. Mas não a forma anárquica, letal, das revoluções. Basta ir à praça, à TV, aos jornais, e produzir o máximo de luz que puder. Isso não expurgará definitivamente do serviço público os sem-caráter, os inumanos, os lobos em pele de cordeiro. Mas mostrará a esses párias que a vaquinha mansa e tetuda tem dono bravo e vaqueiro vigilante. Assim corta-se as patas da hidra monstruosa e ela poderá rugir, cuspir fogo e veneno; mas então não mais poderá levantar-se para caçar. A besta é grande, feia e forte, mas não é invencível.

domingo, 7 de março de 2010

Por onde anda o meu coração?

Tem coisa que nunca muda:

" A revista moralista
traz uma lista dos pecados da vedete"

- Gal Costa, "Parque Industrial", 1968

Você pode imaginar que tipo de alienação (ou perversão) pode fazer com que alguém passe pelos anos 70 e continue escrevendo, lendo e publicando a revista moralista. Mas, ainda pior que não ver o mundo passar, é a lentidão com que a humanidade, ou a sociedade, que seja, evolui. Vide novamente Gal, 1968 :

"E tem jornal popular que
Nunca se espreme
Porque pode derramar
É um banco de sangue encadernado
Já vem pronto e tabelado
É somente folhear e usar"

Pra quem acompanha os passos dos séculos, essa lentidão pode até mostrar um caminho, tendência, esperança: mas, para quem lembra apenas (e mal) dos incidentes desta encarnação, é exasperante.

Todavia, nem era sobre isso que eu ia escrever. Ia falar sobre como era bom antigamente, e da saudade que tenho das minhas amigas e dos meus amigos. Como estarão eles? Como estarão seus corações e mentes, quase quarenta anos depois? Onde o sorriso, o abraço, o afago, aquele afago especial que se faz na alma ao tocar-se o braço de um amigo?

No sign of love behind the eyes

Foi quando topei com você
Que a coisa virou confusão
No salão
Porque parei, procurei
Não encontrei
Nem mais um sinal de emoção
Em seu olhar

Aí eu me desesperei
E a coisa virou confusão
No salão
Porque lembrei
Do seu sorriso aberto
Que era tão perto, que era tão perto
Em um carnaval que passou
Porque lembrei
Que esse frevo rasgado
Foi naquele tempo passado
O frevo que você gostou
E dançou e pulou

Foi quando topei com você
Que a coisa virou confusão
No salão
Porque parei, procurei
Não encontrei
Nem mais um sinal de emoção
Em seu olhar

A coisa virou confusão
Sem briga, sem nada demais
No salão
Porque a bagunça que eu fiz, machucado
Bagunça que eu fiz tão calado
Foi dentro do meu coração

Porque a bagunça que eu fiz, machucado
Bagunça que eu fiz tão calado
Foi dentro do meu coração

- Gilberto Gil, "Frevo Rasgado"