terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Poder Público: Autoridade e Responsabilidade

Com alarmante frequência aqueles que exercem tarefas delegadas pelo poder público no Brasil desconhecem seu verdadeiro lugar e suas responsabilidades. Os resultados são, obviamente, desastrosos, sob qualquer ângulo que se observe uma situação assim: danos ao Erário, à população, à economia, à sociedade, à infância, à educação, à saúde, à segurança...

O servidor público, via de regra, é um sujeito que ganha muito melhor que a média da população brasileira. Pode fazer greve sem ser punido ou demitido. Variações da economia não obstaculam seus seguidos aumentos salariais. Alguns têm também casa (boa), comida (boa), carro (caro), festas (de arromba) e roupa (de grife) lavada, tudo pago pelo contribuinte. Em suma, não partilham da maior parte dos motivos de stress que atormentam os não-servidores. E como é, via de regra, que os servidores públicos tratam o interesse do contribuinte, para não mencionar o tratamento dispensado ao próprio contribuinte? (esta pergunta é meramente retórica. Não se dê ao trabalho de responder.)

Um resultado dessa distorção está expresso no excelente texto de Eliane Cantanhêde, publicado em seu blog e na Folha Online, que reproduzo abaixo.

11/12/2008

O buraco negro é outro

O relatório oficial da Aeronáutica sobre o acidente entre o jato Legacy e o Boeing da Gol, que matou 154 pessoas em 29 de setembro de 2006, inocentou completamente o sistema de radares e de equipamentos do controle aéreo brasileiro. Mas condenou a operação desse sistema. "Buraco negro" nos céus brasileiros, como acusavam os controladores em autodefesa, não há. Mas "buraco negro" no trabalho das pessoas há e muito.

Pelo relatório, que também acusa os pilotos norte-americanos do Legacy de despreparo para voar num jato novo e nos céus brasileiros, o nosso sistema de tráfego aéreo é "deficiente de coordenação" e tem "escassez de pessoal". Esses são bons motivos, mas não os únicos, para explicar a verdadeira lambança dos controladores de vôo naquele dia fatídico.

Um jovem de Brasília nem sequer se deu ao trabalho de ler o plano de vôo do Legacy e passou a informação de qualquer jeito. Um maduro e tarimbado de São José dos Campos (SP) sabia que o plano de vôo previa três altitudes, mas deu de ombros e repassou uma só, como recebera de Brasília, para os pilotos. E ainda fez um "link" entre uma só e o destino final do Brasil, o aeroporto Eduardo Gomes, em Manaus. Os pilotos simplesmente trocaram o plano do papel pelo plano autorizado e foram em frente sempre a 37 mil pés. Durante bom tempo, na contramão!

Quando passaram por Brasília, onde deveriam mudar a altitude na primeira vez, não o fizeram. O controlador que deveria ver não viu. E o pior: outro controlador deveria ter mudado a freqüência de rádio, já que o Legacy mudara o "setor", do sul para o norte. Não fez. Não cumpriu sua obrigação.


Conclusão: além de não corrigirem a altitude na hora certa, os controladores também não tiveram como corrigir depois porque inviabilizaram a comunicação via rádio com a aeronave, que passou a ser um míssil perdido no ar.

Para completar, os pilotos não tinham feito o dever de casa e tiraram a atenção do vôo para fazer algo básico: calcular o peso do aparelho no aeroporto de Manaus, com base na fuselagem, nos ocupantes e no combustível. Enquanto um fazia contas no laptop, o outro digitou dois ou mais números, por mais de 20 segundos, numa "caixinha" que acomoda o transponder e o back-up de outros dados --como o de combustível.

Na tentativa de apurar o nível de combustível, eles acabaram botando o transponder em "stand-by", incapaz de detectar a vinda do Boeing em sentido contrário e, portanto, de acionar o TCAS, o sistema que alerta os pilotos do perigo, por meios visuais e sonoros, e indica a manobra evasiva necessária.

Ainda por cima, o jato viajava em regime especial, o RVSM, que permite uma distância menor entre aeronaves no ar. Em qualquer suspeita de perigo, o procedimento imediato é cancelar o RVSM e aumentar a distância para os padrões tradicionais e mais prudentes. Mas o controlador de Manaus, que "recebeu" o Legacy do Cindacta (Brasília), quando ele ultrapassou a área Nabol do mapa aeronáutico, simplesmente não fez essa recomendação.

Sem rádio, sem transponder, sem diligência, sem preparo e na contramão... bem, deu no que deu.

Com a investigação concluída, dois anos depois, inclusive com peritos norte-americanos e canadenses, todo o acidente fica unicamente nas mãos da Justiça. A palavra agora é com ela. Enquanto a gente reza para que os controladores estejam mais espertos e mais bem preparados e não haja pilotos estrangeiros voando de qualquer jeito por aí. Aqui não é a casa da mãe Joana.
Afinal, Natal, Ano Novo, férias, Carnaval, tudo está chegando. Segurança é bom e a gente gosta.


Eliane Cantanhêde é colunista da Folha, desde 1997, e comenta governos, política interna e externa, defesa, área social e comportamento. Foi colunista do Jornal do Brasil e do Estado de S. Paulo, além de diretora de redação das sucursais de O Globo, Gazeta Mercantil e da própria Folha em Brasília.E-mail: elianec@uol.com.br
Leia as colunas anteriores

quinta-feira, 25 de dezembro de 2008


"Remember to let her into your heart".

Aqui, ali e em todo lugar


To lead a better life I need my love to be here...

Here, making each day of the year
Changing my life with a wave of her hand
Nobody can deny that there's something there

There, running my hands through her hair
Both of us thinking how good it can be
Someone is speaking but she doesn't know he's there

I want her everywhere and if she's beside me
I know I need never care
But to love her is to need her everywhere
Knowing that love is to share

Each one believing that love never dies
Watching her eyes and hoping I'm always there

I want her everywhere and if she's beside me
I know I need never care
But to love her is to need her everywhere
Knowing that love is to share

Each one believing that love never dies
Watching her eyes and hoping I'm always there

To be there and everywhere
Here, there and everywhere

(The Beatles, "Here, There and Everywhere")

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Você sabe que está na Bahia quando...

  • O restaurante do hotel só abre para o café da manhã às 7:30h.

  • A sala de ginástica do hotel só abre às 9:00h.

  • Deus distribui milagres às centenas por minuto, enquanto automóveis, motocicletas, bicicletas e pedestres transitam velozmente pelo caos absoluto das ruas.

  • Apesar da sua irritação, os funcionários do hotel driblam normas internas pra tentar extrair um sorriso da sua cara mal-humorada.

  • Crianças lhe cumprimentam sorrindo e adolescentes prestam, sem medo, a informação que você lhes pediu.

sábado, 22 de novembro de 2008

Classificados

Procura-se um sonho. Que tenha luz, som, forma e calor, desses que aquecem a alma e guiam para um futuro tão querido, mas tão querido, que fazem tudo valer a pena.

O sonho deve ter quatro quartos, tração nas quatro rodas, quatro filhos, quatro horas de carinho todos os dias e som quadrifônico, tapetes e almofadas na sala de música.

Deve ter uma figura central que reúna tudo isso em sua alma, numa etapa preliminar de construção do que será o futuro. Que tenha nos olhos a luz das galáxias, e que saiba fazer mingau de Maizena.

Pago com pacotes de carinho extasiante no corpo e na alma, tigelas de afeto, caixas e caixas de respeito, toneladas de dedicação, cargas de atenção, contêineres de lealdade, carretas de amizade, paletes de proteção, caminhões de fidelidade, vagões de apoio, armazéns de serenidade, barcaças de tolerância e oceanos de um amor que cresce todo dia a ponto de se perder de vista.

O futuro

"É preciso oferecer espaço de sonho"

Gilberto Dimenstein, in "Obama e a ex-futura prostituta de Brasília", Pensata, Folha Online, 15/11/2008.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Primavera de novo

Os dias ficaram mais frios e a casa mais solitária, novamente. Imagino que isso faça parte dos ciclos finais de compreensão e aceitação, mas o retorno de um sentimento que eu já considerava superado é um pouco inquietante.

Redescubro a força da minha ligação e imagino como é que algo tão forte pode ser unilateral. Converso antigas conversas enquanto me desloco pela primavera de Brasília. Ofereço flores, luz, cintilações de chuva e dourados céus de chumbo, querendo que tudo isso fosse teu. Lembro que, se estivesses aqui, sentirias frio.

Claro que tudo tem suas compensações: Victor voltou a telefonar pra mim : ).

Entretanto, não estabeleci nenhuma meta ainda, nada pelo que viver, mesmo após dois arrastados anos de deserto. Moisés deve ter rido até cair da Direita de Deus Pai agora.

Queria tanto que hoje se definisse o meu destino, um bom destino.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Confiança

Quarta-feira, 9 de julho de 2008, 17:29:38
Tycho-1, órbita 19 de Syrrah, constelação de Andrômeda

Sozinhos no meio do deserto inundado de luz, eu e Bam, em forma simbiótica, esperamos.

Uma doce voz nos chama a atenção no alto da colina onde fica o bunker: Bam abre um enorme sorriso ao reconhecer a armadura amarela da sua mãe, que acena lá de cima com uma serenidade que não é sua. Instantaneamente interrompo as cambalhotas de alegria de Bam, gritando na sua mente: “Cuidado! Não é ela!”

Bam para, estarrecido: “É ela, sim, papai. Veja a armadura!” Eu perco o contato. Mas, enquanto Bam escala o morrinho, o chão na face esquerda da colina produz pequenos estalidos e começa a rachar, e ele acha estranho que sua mãe ative uma armadilha de aproximação para ele. E para, olhando para o local das nanogarras e para o sorriso sereno de sua mãe por trás da máscara. Resolve descer, lentamente, de costas. Retomo o contato.

Verificamos que há uma porta de acesso ao bunker, no sopé da colina, e pedimos a ela que abra. A porta emite um clique e abre, mas não há ninguém do outro lado. Do corredor disparamos imediatamente para fora em fuga veloz, Bam no controle.

O local exterior é o Jardim das Mimosoideae, e corremos rua abaixo até encontrarmos um portão aberto. Pela lateral da casa atingimos os fundos, onde um garotinho brinca enquanto sua mãe observa pela janela. Surpresa com a nossa presença, levanta as sobrancelhas, mas a tranqüilizamos: somos Bam e seu pai, vizinhos da casa logo acima. Pedimos permissão para nos escondermos enquanto ligamos para o nosso pai. Ela faz que sim com a cabeça. Colamos no chão e ficamos observando a rua pela fresta do portão, mas ninguém nos seguiu. Dou o comando de voz no telefone: “Pai”. Nesse momento, a dona da casa diz: “Neer”; e eu vejo meu mano chegar ao início da rua na DW4500. Interrompo a ligação pra o Pai e ligo para ele, mas ele não atende. “Barulho da moto, capacete e roupa de couro”, pensei eu. Levanto e grito para ele, deixando a forma simbiótica, mas ele só me vê quando já está estacionando a moto na entrada da nossa casa. Chamo-o urgentemente, e ele desce da moto juntamente com Marg e Boosh (que se apresenta num formato novo) e os três correm na nossa direção.

Relato o que aconteceu, e nos encaminhamos juntos para a casa. Aviso a Bam, que está com os olhos arregalados: “Não é ela”. E ele argumenta: “Mas, papai, é ela, você não viu”? E eu respondo: “Não é ela, filho”. Ele fica quieto e se protege atrás de nós.

Abrimos a porta da frente e entramos. Kalii está nua na sala, andando lentamente de quatro, de forma coleante, com um ar de sensualidade no rosto, que não abandona quando entramos. Aquele olhar vago não combina com sensualidade e nada daquilo combina com o momento, então a imobilizo no chão. Busco sufocá-la com o saco plástico que está em sua cabeça, e ela só percebe a falta de oxigênio muito tempo depois que uma pessoa comum já teria desmaiado. Busco as cicatrizes da cirurgia nos seios, e não as vejo. A pele parece a dela, tem o mesmo brilho, mas é mais clara e muito mais lisa, com microescamas, como o tecido das roupas de natação de última geração.

Onde está Bam? Preciso protegê-lo. Essas pessoas são realmente meus irmãos? Como confiar em alguém, num mundo em que é tão fácil reproduzir outra pessoa ou simplesmente formar uma simbiose com alguém? Em quem confiar? Como testar as pessoas de forma eficiente?

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Enquanto arrumavas a tua casa


Eita! Eu sonhei que tu também sonhavas com patos de borracha. O que mais falta inventar?

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Delicada

Afrouxando seu abraço gelado, a água acariciava-me por inteiro à medida que eu avançava lentamente para a superfície, por entre asteróides luminosos que subiam dos seixos espalhados no fundo do rio, os pulmões ansiosos por ar, os olhos ansiosos por mais beleza.

Na pequena trilha, a luz, caindo do céu aos jorros, estatelava-se de encontro às folhas mais altas e respingava para todos os lados; e, se não era suficiente para aquecer minha pele, inundava minha mente com cores, formas, texturas, perfumes e sons, ao estalar, metamorfosear-se, roçar-me, recender e mimetizar a alma do planeta de encontro à minha.

Bendita seja a Terra, que me afaga como se tanta grandeza não fosse nada.

. . .

És menina do astro sol
És rainha do mundo mar
Teu luzeiro me faz cantar
Terra, Terra és tão estrelada

O teu manto azul comanda
Respirar toda criação
E depois que a chuva molha
Arco-íris vem coroar

A floresta é teu vestido
E as nuvens, o teu colar
És tão linda, ó minha Terra
Consagrada em teu girar

Navegante das solidões
No espaço a nos levar
Nave mãe e o nosso lar
Terra, Terra és tão delicada

Os teus homens não tem juízo
Esqueceram tão grande amor
Ofereces os teus tesouros
Mas ninguém dá o teu valor

Terra, Terra eu sou teu filho
Como as plantas e os animais
Só ao teu chão eu me entrego
Com amor, firmo tua paz

(Milton Nascimento e Marcio Borges, "Estrelada")

Fora do meu Lar

Fora de casa o cheiro de lar me abraça com sua melodia matinal, lembrando-me de que eu gosto muito de lar.

Ficar solteiro é o caralho, eu gosto mesmo é de ser dois, três, mil, dentro da minha casa transformada em lar, em família, em doçura de vida em conjunto, refratando-me em duzentas mil cores, em milhões de suaves sons, na tranquilidade de me dividir.

Pra que eu sirvo, só?

Esta manhã vai ser foda.

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Sweet Dreams

Sweet dreams are made of these
Who am I to disagree?
I travel the world and seven seas
Everybody is looking for something

(Annie Lennox, "Sweet Dreams")

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Segredo

Desde aquele carnaval ela sentiu uma necessidade enorme de ter segredos para mim. Tudo, mesmo as coisas mais banais, tornaram-se segredos impenetráveis. Soube hoje, por acaso, do casamento, com alguns dias de atraso... Pelo jeito a necessidade persiste, embora as outras coisas já tenham morrido. Isso foi somente mais uma deselegância. Eu vou acabar me habituando.

Pergunta: Isso é algum tipo de receio? De mim??? Por quê???

Pergunta: o que eu tenho a ver, agora, com a vida dela? (Opa, isso não é pergunta que eu faça, apenas uma previsão da pergunta mais natural do mundo, e que ser-me-ia feita muito naturalmente.) Nada. Eu só fiquei constrangido por haver falado com os esposos por esses dias e não os haver felicitado, o que poderia passar por uma deselegância da qual eu sou incapaz. Credo, fiquei alérgico a mal-entendidos, má interpretação, má fé obscura e má vontade.

Liguei e parabenizei, mas não como eu teria gostado, porque o meu mal-estar não me deixou dizer o que eu queria ter dito, de verdade: que eu desejo toda a felicidade e que as coisas boas suplantem, suplantem, suplantem, as coisas que não forem as coisas boas no novo casamento. Ela provavelmente não iria acreditar, mas eu teria dito exatamente isso. Eu sou assim. Não é segredo.

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Tu + 10

A saída do gigantesco espaço do teatro é complicada, mas as ruas são agradavelmente iluminadas no caminho.

Distraído, perco a entrada de casa e sou forçado a tomar o retorno pouco usado pra voltar. Como sempre, está escuro e me preocupo se estou fazendo algo errado. Aproveito e troco o dinheiro pra ti, e me deves R$ 55.

Ao estacionar, vejo que vocês haviam descido do carro antes mesmo que eu fizesse o retorno e, no portão da frente, meus 55 estão postos delicadamente num canto da passagem, onde eu possa vê-los.

Tua oferenda aos anjos está sobre o muro largo; cuidadosamente recolho a vela apagada pela chuva suave, juntamente com o meu pente rosa que esqueceste junto.

O filhote, ardilosamente escondido na penumbra da cadeira da varanda, me surpreende com uma risada boa, enquanto queixa-se de que dá uma preguiça danada enfrentar as dificuldades de entrar pela porta, esperando que eu o pegue no colo e o ponha na cama.

Sais de casa rindo ao meu encontro, enquanto te admoestas por haver esquecido a oferenda e avisas ao filhote que, por isso, terão de fazer a oferenda de novo, em redenção.

Vestes somente a tua pele luminosa no corpo de fada, cintilando no ar à luz das estrelas órfãs da lua e, se não me amas, tampouco me desprezas; e recebes sem desdém o meu carinho, meus beijos e até me tomas como porto seguro onde podes dizer, como se isso fosse algo ruim, que hoje és Tu +10, sabendo que eu vou dizer que estás, por isso mesmo, ainda mais linda!

Imagina, até te agradeço por tudo, numa síntese da cerimônia das pétalas, que ensaiei no dia D mas que não pudemos realizar...


. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .


Luz e Mistério

Oh! Meu grande bem
Pudesse eu ver a estrada
Pudesse eu ter
A rota certa que levasse até
Dentro de ti

Oh! meu grande bem
Só vejo pistas falsas
É sempre assim
Cada picada aberta me tem mais
Fechado em mim

És um luar
Ao mesmo tempo luz e mistério
Como encontrar
A chave desse teu riso sério

Doçura de luz
Amargo e sombra escura
Procuro em vão
Banhar-me em ti
E poder decifrar teu coração

És um luar
Ao mesmo tempo luz e mistério
Como encontrar
A chave desse teu riso sério

Oh grande mistério, meu bem, doce luz
Abrir as portas desse império teu
E ser feliz

(Beto Guedes e Caetano Veloso, "Luz e Mistério")

domingo, 14 de setembro de 2008

Nothing Gold Can Stay

Nature’s first green is gold,
Her hardest hue to hold.
Her early leaf’s a flower;
But only so an hour.

Then leaf subsides to leaf,
So Eden sank to grief,
So dawn goes down to day
Nothing gold can stay.

- Robert Frost, "Nothing Gold Can Stay".

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Em defesa do relativismo suave

Pela segunda vez "chupo" um artigo de outro blog -- e vou fazê-lo sempre que o texto valer a pena, ora bolas. No caso, uma bem-humorada defesa do relativismo, esse inimigo das consciências -- e também da insônia.

Quem escreve é João Pereira Coutinho, colunista da Folha. Degustem.

Em defesa do relativismo suave

O problema do mundo é não ser um pouco mais relativista. Eu sei, eu sei: o relativismo é mau, dizem, porque a idéia de que os valores dependem de meras escolhas individuais, sem nenhuma justificação externa ou racional, é uma fraqueza epistemológica e ética da maior gravidade. Fato. Mas eu falo de um relativismo ligeiro, um relativismo banal, o relativismo das coisas menores. Como um tempero que se coloca sobre o prato da vida, só para dar algum sabor mortal a tudo o que fazemos e sentimos. É o relativismo suave que ensina que nada tem uma imporância tão absolutamente esmagadora quando o fim é certo e o esquecimento também.

Lembro tudo isso com notícias que leio na imprensa portuguesa. Nos últimos dias, soube que 32 mulheres foram assassinadas em 2008 por seus namorados ou maridos. Existem cenários macabros de homens que apontam uma arma e disparam sem pestanejar em plena via pública. O resto é igualmente macabro: estrangulamentos, espancamentos, envenenamentos. O diabo a quatro. Motivos? Passionais, sempre passionais: o homem descobre, ou suspeita, que a mulher não é casta. E num gesto de loucura, comete a loucura.

E então recordo uma conversa que tive uns anos atrás com um amigo, em São Paulo, e o relato que ele me fazia de um conhecido jornalista que entrara em cenário idêntico: descobrira que a namorada, mais jovem, se afastara dele para procurar uma "nova vida", como se diz nas telenovelas; e ele, de cabeça perdida, incapaz de aceitar a rejeição, pegou na arma e fez o que fez. Arruinou a vida, a carreira, os amigos, a família, e etc. etc. etc.

Ouvi a história e perguntei aos meus pobres neurónios se eu seria capaz disso: amar uma mulher ao ponto de a matar por despeito. E a resposta, toc toc toc, é negativa. Tudo por causa de meu relativismo suave, que me acompanha dia após dia como um animal de estimação. Sim, tenho minhas fúrias, como qualquer pessoa racional. E existem momentos de um desespero tão profundo, e tão medonho, que chorar é um luxo. Mas mesmo quando o demónio se intromete na pacatez dos meus dias, existe um lado de mim que ri dele. Como se o espírito deixasse o corpo e, planando sobre a carcaça, contemplasse o absurdo da minha condição. O absurdo da condição humana. E uma voz invisível segreda-me ao ouvido: será que vale a pena, companheiro? Será que vale a pena tudo isso quando tu estarás morto no futuro médio? E, depois da voz, vem a imagem: como num filme de Bergman, eu, velho e morto, em caixão aberto.

O relativismo liberta-nos para fazer o mal, como acreditava Dostoiévski? Não creio. Em doses temperadas, o relativismo é um convite para não fazermos o mal. Ele esvazia o nosso patético ego como uma agulha que fura o balão de uma criança. E ele é sobretudo útil em matéria de amor: somos amados, magoados, atraiçoados. Acreditamos que, depois do abandono, teremos uma dor inultrapassável, que se vai prolongar pelos séculos seguintes.

Mas a verdade é bem mais triste e, paradoxalmente, bem mais feliz. Tudo passa. A dor vai diluindo-se em tristezas menores, que ficam como o pó esquecido nos cantos da casa. E certo dia descobrimos que o tempo cobriu tudo com invisíveis mortalhas; e o passado é o porto de onde a nossa embarcação já se afastou há muito. Vemo-lo ao longe, por entre a neblina. Mas não há regresso.

Desesperado leitor: se achas que a dor de hoje te autoriza a tudo, lembra-te que és nada e que a tua vida será nada. E festeja essa certeza com a alegria sincera dos náufragos resgatados.

João Pereira Coutinho, 32, é colunista da Folha. Reuniu seus artigos para o Brasil no livro "Avenida Paulista" (Ed. Quasi), publicado em Portugal, onde vive. Escreve quinzenalmente, às segundas-feiras, para a Folha Online.E-mail: jpcoutinho@folha.com.br Site: http://www.jpcoutinho.com

terça-feira, 26 de agosto de 2008

Ups

De repente eu tinha saído da infância. Conhecia truques, tinha legiões de amigos e, uhu!, namorada!, que arranhava meus pulsos porque tinha lido, em algum lugar, que isso causava excitação sexual.

Tive dois bebês. Não fiz quase nada direito da primeira vez, mas me esforcei muito e, se pudesse, refaria tudo aquilo onde errei. Juro. Da segunda vez eu já era senhor do meu destino e dono de castelo. Minha mulher era a coisa mais importante do mundo, tanto quanto obter reconhecimento pelo meu trabalho. Brinquei de carrinho na barrigona, fiz novamente todas as preces e orei por todas as bênçãos. E elas vieram!

É bastante triste não os ter comigo. Mas as lembranças são verdadeiros sonhos. Eu devia ser mãe. Nunca nunca nunca nunca nunca nunca os separariam de mim.

Fiquei solteiro

Isso há de se tornar uma coisa boa. Né?

terça-feira, 15 de julho de 2008

No aeroporto

Acordei muito antes do despertador. Bagagem pronta, banho rápido, um breve passeio pelos jornais na Internet e partida. Nem precisava chegar tão cedo ao aeroporto, mas a ansiedade que me move há semanas não pode mais ser reprimida: quero, sim, chegar.

Se bem que deixei tudo para a última hora: arrumei a bagagem na véspera, fui comprar o presente do meu filhote na véspera, documentação na véspera... uma parte de mim nem quer ir, e entendo bem por quê.

Mas vou!

Vou encerrar isso tudo pra começar de novo. Os degraus estão mais altos, as possibilidades de escolha diminuem, mas agora tenho asas (espero) e vou voar com elas.

. . . . . . . . . .

Hoje faz um frio infernal (hahahaha) em Brasília. A mesa de mármore, congelada, torna um sacrifício usar o mousezinho (tenho rixa com o tal do "synaptics pointing device", o mouse do laptop, que, de tão besta, nem tem nome, é "device"). A temperatura da corrente de ar que sopra da pista de pouso deve estar muito perto do zero, porque, a essa altura, minhas mãos estão congelando e a melhor maneira de evitar a paralisia é continuar escrevendo...

. . . . . . . . . .

Fico pensando nas diversas reações que a minha chegada trará. A melhor de todas será a do meu filhote, que, sem surpresas, ficará, sim, muito feliz em me ver. Os abraços dos manos, a grande satisfação deles, o abraço saudoso da minha mamãe tão querida e que nem curti direito nesses últimos 27 anos... O abraço do meu pai, meu pai.

Mas.

Tem um divórcio no meio do céu. Oro para que tudo dê certo, tudo se resolva bem, tudo fique bem, minha dor fique num canto e morra, ela fique bem, eu fique bem, Vic fique bem.

God willing, vai passar e, dizem os oráculos, eu vou ser feliz... é muito importante, para a sobrevivência dos oráculos, que eles digam coisas assim; e também, irra, é bom ouvir. O que seria da vida sem esperança? Que vivam os oráculos e, como diria Zé Xico Barbixa Magno, venha o que tiver de vir -- desde que seja bom, af!

Jampa, lá vou eu.

sábado, 12 de julho de 2008

Más Allá

Cuando das sin esperar
Cuando quieres de verdad
Cuando brindas perdon
En lugar de rencor
Hay paz en tu corazón

Cuando sientes compasion
Del amigo y su dolor
Cuando miras la estrella
Que oculta la niebla
Hay paz en tu corazón

Mas alla del rencor
De las lagrimas y el dolor
Brilla la luz del amor
Dentro de cada corazón

Ilusión, navidad
Pon tus suenos a volar
Siembra paz
Brida amor
Que el mundo entero pide mas

Cuando brota una oracion
Cuando aceptas el error
Cuando encuentras lugar
Para la libertad
Hay una sonrisa mas

Cuando llega la razon
Y se va la incomprension
Cuando quieres luchar
Por un ideal
Hay una sonrisa mas

Hay un rayo de sol
A traves del cristal
Hay un mundo mejor
Cuando aprendes a amar

Mas alla del rencor
De las lagrimas y el dolor
Brilla la luz del amor
Dentro de cada corazón

Ilusión, navidad
Pon tus suenos a volar
Siembra paz
Brida amor
Que el mundo entero pide mas

Cuando alejas el temor
Y prodigas tu amistad
Cuando a un mismo cantar
Has unido tu voz
Hay paz en tu corazón

Cuando buscas con ardor
Y descubres tu verdad
Cuando quieres forjas
Un manana mejor
Hay paz en tu corazón

Mas alla del rencor
De las lagrimas y el dolor
Brilla la luz del amor
Dentro de cada corazón

Ilusión, navidad
Pon tus suenos a volar
Siembra paz
Brida amor
Que el mundo entero pide mas

sexta-feira, 11 de julho de 2008

Phone chat

- Hello, Eve?
- Yes?
- It's Norman, how are you?
- Oh, hi, Norm! How are you?
- Fine! Look, I was checking some old papers and ran into one with your phone number on it. I hope you don't mind I'm calling.
- No, not at all!
- Look, I have been thinking about you over the last few days and thought that maybe we could meet tonight and talk a little?
- I - uh - I do not understand... is there any special reason for that?
- Well, the special reason would be you! (just thinking: "OMG I can't believe I just said that")
- ... well, heh, I have a previous arrangement for tonight, but maybe some other time... I will be traveling next Thursday, but...
- I will be traveling by Tuesday too, so maybe we could talk sometime afterwards. Maybe I could call you again when I come back...
- OK, that's fine. See you!
- See you!

Melhor Vinho


Por mais raro que seja, ou mais antigo,
Só um vinho é deveras excelente
Aquele que tu bebes, docemente,
Com teu mais velho e silencioso amigo.

Mário Quintana

segunda-feira, 7 de julho de 2008

A Cor do Amor

Minha casa está repleta de amor. Já houve tanto amor aqui dentro que o lugar terá boas vibrações por muitos e muitos anos, sem reabastecimento. Os momentos que não foram de amor foram todos apagados e ficou somente aquela cor dourada das coisas boas.

É aqui que eu vivo.

Este é o meu lar.

Minha casa sente saudades, como eu, da alegria de outros tempos. Mas está cheia de amor, e o amor vai fazer a alegria voltar.

Começar

Nos últimos dezenove meses, levantar da cama tem sido um esforço de otimismo. O sonhos nem me deixam escolher como o meu dia vai começar. O que faço é criar um dia novo pra mim todos os dias, vencendo a saudade, a solidão, o cansaço, o desamor e a vontade de desistir.

Aninha foi o resultado mágico desse não-querer desistir; a consolidação da poeira mística da minha vontade de sobreviver, de me reharmonizar e ficar feliz por mais tempo. Agradeço a ela e à sublime mecânica do Universo pelos maravilhosos presentes recebidos: alegria, afeto, afeição, carinho, ternura, comunhão, dedicação, cuidados, e até amor! Não lhe pude dar muito em troca e fico triste com isso. Deus lhe pague e lhe acompanhe e lhe conduza em Suas mãos!

Meu caminho agora é meu e devo assumir essa responsabilidade -- será a minha primeira vez? Eu já fiz isso muitas vezes antes, quando tinha a vida toda pela frente. Depois do fim dos meus sonhos, e agora que cruzo a fronteira entre chegar e ir embora, a responsabilidade é maior e o caminho está solitário.

O que vou escolher? Como vou viver? Como arrumar tudo isso? Como começar com o que tenho?

Vamos ver. Tenho o bastante para começar. Tenho filhos e pais e irmãos e talvez amigos que dependem de um gesto meu, e a responsabilidade por eles me mantém de pé. Superar a tristeza, vai dar certo. Força!

quarta-feira, 2 de julho de 2008

Pacto de Vida

Ter de resistir à dor, à dor
Sem comprender por que a dor, a dor
Ter de suportar viver a dor, a dor
E sem merecer a dor, a dor

Se é esse o meu destino, quem é o algoz que o traçou
Quem me contaminou
Quem me doou a dor


Homem não existe para ser só animal
A sua história é mais que corporal
Abre o sentido para ter a liberdade
Com todo mundo que é seu igual
e solidário

Pensará...
Amará...
Sonhará...
Saberá...
Que a felicidade da cidade não tem que o mato matar

Aí a dor vai nos unir

O fim da dor começa é assim
É o filho que não para de crescer
A fruta que vai madurar
Aquela mão, aquela paz, morena, é aquele olhar
Que é sempre verde, verdejar
É aquele gesto humano,
É aquela voz humana,
É aquele amor humano, que chega e diz que vai ficar.


(Milton Nascimento e Fernando Brant, Yanomâmi - Pacto de Vida)

quinta-feira, 26 de junho de 2008

Lembrando-me de mim

Ganhei mais um presente! Uma mensagem de Jê trazia uma lembrança remota de mim -- e foi bom lembrar de mim, de como eu queria ser, de como eu quero ser, de como eu sou. Beijo Jê!

“Hoje acordei com saudades
De voar na imensidão de mim mesma
E entre meus guardados,
Procurei minhas asas
- houve um tempo em que voava -
E me perdia numa estranha alegria
Escutando o vento

Agora outra vez
Pelo céu quero voar
E, por sobre a muralha desta vida,
Construir meu momento.
Sem medo,
Deixar-me envolver na mais doce loucura
Lançar-me nesse vazio,
E absorver o silêncio profundo e vasto
Que me dá todas as respostas
Hoje quero voar
Libertar o coração das amarras,
Deixá-lo livre
Para desvendar os horizontes
Viver o sonho mais sonhado.
E, num ato encantado,
dormir no colo da lua.”

Atravessando os meus temporais

Hoje fui à página de Beth pra deixar um abraço de aniversário e acabei ganhando um presente: uns versos de Lenine, fluentes e bons de se pensar a respeito, que tomo a liberdade de colar no meu mural. Uns versos tão bons que parecem comigo, contigo, com ela, com eles...

"Andei pra chegar tão longe
Daqui de longe eu olhei pra trás
E foi como ver distante
Eu atravessando os meus temporais
Sonhei muito diferente
Eu bati de frente, corri atrás
E foi como se eu soubesse
Inverter o tempo e arriscar bem mais
Andei pra chegar mais longe
E de lá de longe me ver feliz"
Lenine

terça-feira, 17 de junho de 2008

How Can I Go On

(Freddie Mercury and Mike Moran)

When all the salt is taken from the sea
I stand dethroned, I'm naked and I bleed
But when your finger points so savagely
Is anybody there to believe in me
To hear my plea and take care of me?

How can I go on, from day to day
Who can make me strong in every way
Where can I be safe, where can I belong
In this great big world of sadness?
How can I forget those beautiful dreams that we shared
They're lost and they're nowhere to be found
How can I go on?

Sometimes I seem to tremble in the dark, I cannot see
When people frighten me
I try to hide myself so far from the crowd
Is anybody there to comfort me
Lord, take care of me

How can I go on
From day to day
Who can make me strong
In every way
Where can I be safe
Where can I belong
In this great big world of sadness
How can I forget
Those beautiful dreams that we shared
They're lost and they're nowhere to be found
How can I go on?

sexta-feira, 6 de junho de 2008

Pra acalmar

Tô preso dentro de mim
e esperneio e grito e me debato tanto
que o meu corpo, atônito, se locomove
dança, corre, caminha
arruma a casa e trabalha e dorme
pra apagar o fogo que o queima de dentro sem poder sair!

Eu quero a vida, a liberdade, o amor, a alegria
de que o meu corpo desfruta às vezes
e de quando em vez
eu só queria
um dia
dançar, correr, caminhar
arrumar a casa e trabalhar e dormir
como ele faz
e deixá-lo fazer tudo isso
em paz.

sábado, 17 de maio de 2008

A Ilha

O chato do amor é que vicia. Se você se habituou a viver rodeado(a) de amor, nunca mais vai querer viver de outra maneira. A saudade é um tipo de fome.

Ah! Quem me dera ir-me contigo agora
A um horizonte firme -- comum, embora!
Ah ! Quem me dera amar-te sem mais ciúmes
De alguém em algum lugar que nem presumes!...

Ah! Quem me dera ver-te sempre ao meu lado
Sem precisar dizer-te, jamais: "cuidado"!
Ah! Quem me dera ter-te, como um lugar
Plantado num chão verde para eu morar-te!

Ah! Quem me dera ter-te,
Morar-te até morrer-te.

(Vinicius de Moraes, "O Mais-que-Perfeito")

Como não dá pra simplesmente desplugar e ainda há agravantes como o karma, depois que o mar secar e você perceber que não existe ilha e mar, somente ilha, provavelmente a melhor coisa a fazer é procurar mais amor. Aí começa o perigo: há gradações de amor e, pra piorar, há também quantidade! Claro que um amor dos bons suplanta todo o resto e faz desaparecerem mar e ilha, e tudo se torna amor. Mas isso já é um absurdo e um excesso, que todos nós já provamos (azar de quem não provou, porque é bom!), mas do qual não queremos uma segunda dose. Ah, ok, tá bom, queremos sim.

Voltando ao perigo: eu acho que nenhum amor começa em sua plenitude. Vai crescendo. E é muito bom ter paciência quando for buscá-lo de novo, porque dificilmente o novo amor vai ter de imediato o mesmo sabor, a mesma abrangência e causar o mesmo pulsar, no corpo todo e na mente, que aquele outro, excessivo (bah), causava.

Em suma: nada de estragar o novo amor (seja lá a que for!) com desapontamentos derivados de expectativas imprudentes.


U2 - "Window in the Skies"

Falando de amor, aproveitei pra me vingar do U2, que proibiu que o YouTube permitisse (afe, nunca mais direi uma coisa dessas) a incorporação desse vídeo inacreditável. Taí, inseri no meu blog. Vão encarar? Amo vocês, nem que seja à força!!!

O exótico parágrafo acima (esse aí, sobre o U2) traz à luz sentimentos como vingança, opressão, ciúmes e violência, que têm sido espertamente vinculados por alguns ao amor, mas que estão mais para a satisfação do ego do que da alma -- e que, portanto, guardam uma distância infinita do verdadeiro amar.

Amar, como eu já disse, deve ser limpo, transparente, correto, justo e, se possível, perfeito.

quarta-feira, 30 de abril de 2008

Quando penso que esqueci


Eu já esqueci você, tento crer
Seu nome, sua cara, seu jeito, seu odor
Sua casa,
sua cama
Sua carne, seu suor
Eu pertenço à raça da pedra dura.


(João Bosco, "Memória da Pele")


sábado, 5 de abril de 2008

A Revelação de Anna e Willis e as Notas Acessórias

Do alto, assistíamos à argumentação agitada dos quatro.

“Tão reduzidos estão que sequer perceberam que o telhado da casa sumiu”.

“Vamos falar com eles? Já começamos, então vamos terminar isso”.

“Tem certeza”?

“Sim”.

“Então que seja”.

Chamamos a atenção dos quatro e os retiramos do estado de exclusiva visão do inferior; descemos e nos reduzimos e, num instante, tínhamos a forma humana. Eles estavam estarrecidos, claro, mas entenderam imediatamente que algo absolutamente novo estava acontecendo. E sentiram o perigo. E esperaram que falássemos.

Acalmamos a todos e o casal mais velho saiu. Ficamos com Anna e Willis na ante-sala decorada no estilo sóbrio, simples e alegre da classe média norte-americana dos anos 70.

“Bem, vocês têm o seu grande problema nas mãos. Isso não vai ser fácil”.

Anna tinha os olhos muito abertos e a expressão apreensiva. Willis sentia-se perdido.

“Vocês amam-se muito, não”?

Não era preciso responder a isso.

“Fariam qualquer coisa um pelo outro”?

Eles entreolharam-se.

"Qualquer coisa que fosse lícita, moralmente correta, e exclusivamente entre vocês dois”?

“Sim”.

“Willis, parta”.

Ele foi.

“Anna, Willis vai viajar. Durante essa viagem, ele morrerá. Você receberá de volta as coisas dele, em uma sacolinha de algodão cru. Três objetos apenas, e mais uma coisa que somente você saberá que está ali. Resista e vocês serão recompensados. Tenha paciência. No quinto ano, você receberá boas notícias, quando a sua dor já tiver sido dominada. Adeus, pequena. Persevere”.

No tempo certo, a sacolinha chegou, e Anna viveu a sua dor. Willis não voltaria. Mas ela teve confiança; a confiança fez com que sua dor fosse aceita e, assim, isso não a matou. E ela pôde, aos poucos, voltar a viver.

No quinto ano, Anna esperava um filho. Era um menino lindo e, quando nasceu, Anna viu novamente a sacolinha guardada e, nela, uma mecha – os fios do sinal que Willis tinha na coxa esquerda. A criança tinha um sinal igual e sorria para ela como Willis sorriria ao voltar para casa.

___________________________________________

Notas acessórias do despertar de 5 de abril de 2008:

A imagem é de que, nesta vida, nossa vida em conjunto é um casulo cheio de um amor triste. É um casulo saudável, vivo, luzidio e forte, que almeja, como todo casulo, tornar-se ninfa e, depois, vir a ser algo maior. Mas que percebe permanecer um casulo: saudável, vivo, luzidio, forte; precioso, sim, mas sempre um casulo triste.

sábado, 29 de março de 2008

Amigos

Desde quando me lembro, sempre tive multos numerables amicos. Os primeiros foram meus primos: Paulo, companheiro de muitas descobertas e de muitas afinidades; e Pinto, com quem desbravava os quintais em Mamanguape. Na escola primária tinha Augusto, que me parece ter sido meu primeiro amigo que não era um parente. Ele era neto da diretora e, durante algum tempo, eu pensei que o nome da escola (Escola Particular Augusto dos Anjos) se devesse a ele.

Depois, no Pio XI, fiquei amigo de um garoto cujo nome eu nunca soube realmente. Ele sabia o meu, e eu tinha vergonha de perguntar: achava que tinha obrigação de saber o nome dele. Fiquei chamando de 51, que era o número dele na chamada. Éramos ambos retardatários e ficamos no fim da lista. Meu número era 55. Ele era um dos sujeitos mais legais que já conheci.

No CECA comecei a fazer uma quantidade maior de amigos. Vou tentar enumerar alguns: havia Luciano, com quem eu trocava golpes de judô e karatê no horário do intervalo, rolando no chão aos apertões, socos de mentirinha e alguns pontapés. Era um amigão, sujeito bem-humorado e de grande espírito esportivo. Foi com ele que fui pela primeira vez ao teatro, fazer um teste para ator, que não deu lá muito certo.

Havia os rapazes que lideravam o movimento no colégio, e que me aceitaram entre eles -- penso que nem tanto pela minha habilidade atlética, mas principalmente pela minha incomum generosidade durante as provas e disponibilidade total para compartilhar conhecimento. Lembro agora de Robson, Zaqueu, Wanderley e Roginério; das gêmeas Glória e Gorete, Valéria, Gêneva e uma amiga que perdi por haver dado um chega-pra-lá num guri chato que depois soube ser irmão dela. Ah, e Zé Carlos, que tinha um bruta som e morava perto do colégio. Fiquei amigo de alguns dos amigos do meu primo Paulo, como Clóvis, e chegamos a formar uma banda de rock chamada NoPloCló (hahahahahahaha) que dispunha de um baixo feito de isopor, uma bateria composta por várias panelas e caixas de papelão, e um gravador pra gravar nossos rocks heavy metal berrados por mim em um inglês engraçadíssimo, imitando Robert Plant.

Vieram depois os amigos do Lyceu. Meus três anos de segundo grau me proporcionaram um número de novas amizades que ultrapassa minha capacidade de lembrar de todos eles. Basicamente, eu queria a amizade do pessoal do Grupo Folclórico, do Coral e do pessoal que fazia música no colégio, como Dida Fialho, Tom Ray, Lis e um grupo de Jaguaribe com o qual tive o privilégio de tocar algumas vezes. Houve os amigos do Grupo de Flauta Doce do SESC: Joaquim, Berna (através de quem tive o privilégio de conhecer Fernandito, hoje Fernando Pintassilvo) e Roderick.

Conheci Milita, Soraya, Tadeu Mathias, Marta, Gorete Irineu, Espínola.

Depois, já na faculdade de Economia, trabalhando pra manter minha nova família (Mônica e Kaio) conheci Saulo Barreto, Dr. Guilherme Rabay, Dr. Carneiro Braga e Dona Lígia, Hugo Brito, Emídio, Ilene Helfand e aqueles que seriam os amigos que a distância não separa e o tempo não apaga: Sérgio Carneiro e Paulo Machado.

Este post não se dedica às grandes almas que namorei, mas algumas das pessoas que tive o privilégio de namorar tornaram-se minhas amigas pela vida afora: Jê, Verinha, Mônica.

Minha péssima memória me impede de lembrar de muitas e muitas outras pessoas que, em alguma época, aqueceram meu coração e marcaram a minha alma com sua amizade. Irei acrescentando os nomes à medida que as lembranças forem voltando ou quando justos protestos se fizerem ouvir. Peço a compreensão dos que ainda não enumerei aqui.

Minha vinda para Brasília tinha a finalidade de arranjar-me um novo futuro, já que em João Pessoa não havia muitas oportunidades de trabalho para mim. Aqui conheci muita gente com quem trabalho até hoje. Fiz algumas boas amizades no trabalho, como Marcelo Gurgel, Eduardo Dantas, Marcelo Kasbergem, Álvaro Valente, Laércio Atuati.

Conheci as pessoas simples e muito amáveis do Planat: chegaram a preparar uma festa-surpresa no meu segundo casamento, na casa do querido João Batista. Jaime Lennon, Elias, Lili...

Infelizmente, hoje em dia sinto-me incapaz de dar profundidade às minhas amizades. Talvez o clima de Brasília favoreça o descompromisso e as amizades puramente de trabalho. Ou talvez, mais provavelmente, o problema seja eu mesmo.

Sinto falta de ter amigos. Mas a culpa é minha: gosto mesmo é de ficar em casa e durante todo o tempo em que vivo em Brasília fiquei centrado apenas no trabalho e na minha família, que era o meu mundo todo: Claudia e Victor.

Depois da separação procurei fazer novas amizades, e conheci pessoas muito muito simpáticas na Comunidade do Vinho. Voltei a alimentar a enorme amizade dos meus irmãos. Procurei expandir meus horizontes, mas ainda há muito trabalho a fazer até que eu seja novamente digno de ter amigos. Faltam-me, hoje em dia, as principais faculdades para conquistá-los e mantê-los: dedicação generosa, consideração e franqueza. Tornei-me um poste ou uma parede. Espero poder sair de dentro de mim logo, antes que a vida passe. Gostaria de ter alguns amigos que dissessem dois ou três elogios no meu funeral.

domingo, 23 de março de 2008

Errante

(Florbela Espanca - 23/04/1917)

Meu coração da cor dos rubros vinhos
Rasga a mortalha do meu peito brando
E vai fugindo, e tonto vai andando
A perder-se nas brumas dos caminhos.

Meu coração o místico profeta,
O paladino audaz da desventura,
Que sonha ser um santo e um poeta,
Vai procurar o Paço da Ventura…

Meu coração não chega lá decerto…
Não conhece o caminho nem o trilho,
Nem há memória desse sítio incerto…

Eu tecerei uns sonhos irreais…
Como essa mãe que viu partir o filho,
Como esse filho que não voltou mais!

segunda-feira, 17 de março de 2008

Poema de aquecer o coração em três quartos

O vinho é bom pra entortar a alma
E desabrir a vida
E desatar a brida
E derrubar a porta
E acompanhar a massa
e reverter a mossa
e pra ninar promessa
e devolver as horas
e esquecer da dor.

Também é bom pra esquecer do amor
E ruminar o verso
E refazer o ser
E arrumar a casa
E se aninhar na asa
E perfumar a rosa
E acordar em paz.

quinta-feira, 13 de março de 2008

Quase falei

..."Se eu cantar a alegria sai falsa
Se eu calar a tristeza começa
E eu prefiro dançar uma valsa
Que ouvir uma peça

E eu recuo, eu prossigo e eu me ajeito
Eu me omito, eu me envolvo e eu me abalo
Eu me irrito, eu odeio, eu hesito
Eu reflito e me calo."

(Sueli Costa/ Paulo César Pinheiro)

sábado, 1 de março de 2008

Does Your Life Have a Vision or are You Blowing in the Wind?

Chupado do Blog de John Wesley: (http://www.pickthebrain.com/blog/does-your-life-have-a-vision-or-are-you-blowing-in-the-wind/)

The E-Myth Revisited - Michael E. Gerber

"Great people have a vision of their lives that they practice emulating each and every day.

They go to work on their lives, not just in their lives.

Their lives are spent living out the vision they have of their future, in the present. They compare what they’ve done with what they intend to do. And where there’s a disparity between the two, they don’t wait very long to make up the difference.

They go to work on their lives, not just in their lives.

I believe it’s true that the difference between great people and everyone else is that great people create their lives actively, while everyone else is created by their lives, passively waiting to see where life takes them next.

The difference between the two is the difference between living fully and just existing. The difference between the two is living intentionally and living by accident".

sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

Longe e Perto

Chegar a Congonhas é metade do caminho de volta pra casa, e me enche de alegria. Nem mesmo a longa fila da água caríssima da Casa do Pão de Queijo me enche o saco a ponto de diminuir um cêntimo (uia! fui longe) do prazer de voltar. Esperar, embarcar, decolar, ver São Paulo reluzir e apagar-se lá em baixo, dormir um pouco, chegar!

E, no entanto, chegar parece uma daquelas operações em que se divide um número pela metade, e o resultado novamente pela metade, repetindo a operação infinitamente, chegando-se cada vez mais próximo do zero, sem nunca chegar.

Talvez eu esteja, em Congonhas, mais perto do meu lar do que quando, finalmente, chego em casa.

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Encontros e Despedidas

(Milton Nascimento)
Mande notícias
Do mundo de lá
Diz quem fica
Me dê um abraço
Venha me apertar
Tô chegando...

Coisa que gosto é poder partir
Sem ter planos
Melhor ainda é poder voltar
Quando quero

Todos os dias é um vai-e-vem
A vida se repete na estação
Tem gente que chega pra ficar
Tem gente que vai
Pra nunca mais

Tem gente que vem e quer voltar
Tem gente que vai, quer ficar
Tem gente que veio só olhar
Tem gente a sorrir e a chorar

E assim chegar e partir
São só dois lados
Da mesma viagem
O trem que chega
É o mesmo trem
Da partida

A hora do encontro
É, também, despedida
A plataforma desta estação
É a vida desse meu lugar
É a vida desse meu lugar
É a vida...

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

O Blackout do Messenger

Folha Online - 27/fev/2008 - Internautas em várias partes do mundo tiveram dificuldades para acessar o Windows Live Messenger, o antigo MSN, ontem (26). Alguns usuários não conseguiam se conectar ao programa ou demoraram para conseguir o acesso.


Deu no Tuvalu Times

Vários venusianos foram vistos arrancando as antenas dos satélites em órbita da Terra, só pra ver os aparelhos brigarem uns com os outros.

As mães deles (dos venusianos, não dos satélites) reclamaram e eles foram pra casa fazer as tarefinhas do colégio mas, só de pirraça, voltaram depois com sprays pra pichar o site da Microsoft. Aborrecidos porque os sistemas de segurança não permitiram a pichação, eles resolveram vingar-se derrubando tudo, inclusive os servidores do Messenger. Foram embora ameaçando voltar pra derrubar o WYD, o Grand Chase, o Ragnarok e o Hero Online tão logo acabe a tempestade solar.

Vai dar no NY Times

A NSA (não confundir com a NASA) classificou como sendo terroristas as atividades venusianas na órbita da Terra, e invadiu o planeta vizinho seguindo uma pista de que, além da possível existência de armas químicas, como sprays de tinta, no local, Bin Laden também estaria escondido por lá.

Durante o ataque, a explosão de um artefato nuclear da Agência derrubou acidentalmente o Surfista Prateado e causou um pulso eletromagnético que neutralizou as células de hidrogênio que alimentavam os aparelhos de sobrevivência da mãe dos delinquentes pichadores de Vênus, a qual sofreu falência múltipla de todos os sistemas, sendo impossível reativar qualquer um deles. O desplugamento acidental causou uma onda de protestos e manifestações violentas seguidas de saques, e a embaixada norte-americana no Taiti foi incendiada por grupos armados ligados ao Khmer Vermelho na Dinamarca.

Em Plutão, onde a população ainda está revoltada porque o antigo planeta foi rebaixado à categoria de anão, donas-de-casa saíram às ruas com cartazes e faixas protestando contra a iminente chegada da "nave imperialista" New Horizons, aos gritos de "FMI Go Home", "Internet Já!" e outras palavras de ordem do DCE do P.

A Associação dos Supernerds Neonazistas de Cacimbão da Areia divulgou uma nota de apoio às ações da NSA, afirmando ser "um absurdo que, depois de bugar o MSN, os vândalos alienígenas queiram também derrubar o WYD, justamente quando vai haver evento de triple drop de Poeira de Lac", e afirmaram em rede nacional que "se o lag piorar, vai ter peixeira no bucho dos venusianos".

A ONG "Peixeira Nunca Mais" criticou duramente a nota da ASSUNECA e teve sua sede crivada de facadas durante a noite. Um policial da delegacia em frente, que pediu para não ser identificado, disse que não viu nem ouviu nada, e que tudo não passa de boato, apesar de o prédio ter sido completamente depredado.

O policial afirmou à reportagem que não tem MSN e tem raiva de quem tem.

A verdade

Descobriu-se que o ataque de alienígenas não passava de um golpe publicitário do marqueteiro Duda Mendonça para encobrir as atividades de George W. Bush no Oriente Médio.

Segundo fontes não-oficiais, Hillary Clinton e Barak Obama estariam preparando tumultos da Ku Klux Klan na Síria para justificar uma invasão em larga escala daquele país pelas forças de Israel. A tática incluiria atacar simultaneamente o Irã a partir da frota norte-americana ancorada no Golfo Pérsico, aproveitando falsos atentados xiitas orquestrados por Fidel Castro no norte do Paquistão.

A Índia, revoltada com os atentados, atacaria, por engano, as bases dos Carecas do ABC no Tadjiquistão , abrindo as portas do Norte da China para a entrada das forças dos EUA, que criariam uma base em Katmandu para explorar as imensas reservas de gás e petróleo da região e estabelecer um oleoduto que iria em linha reta desde o sul da Mongólia até o Mediterrâneo, passando pelos países aliados e pelos ocupados pelas forças da Coalizão. As revoltas teriam ainda o apoio tático da Al-Qaeda, já que Osama Bin Laden tem interesse em ajudar os EUA, na tentativa de receber o dinheiro que emprestou ao presidente Norte-Americano quando George Bush filho quebrou, pela terceira vez, a companhia petrolífera da família.

Segundo uma fonte diplomática que não quis se identificar, a queda do Messenger teria sido causada pelo uso indevido de cartões corporativos.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Queimei a pizza de novo

Não é que eu não saiba cozinhar: meu problema é não ser capaz de dedicar tempo a isso. Parece ser uma atividade secundária pra mim. Geralmente ponho no forno e esqueço. Se não fosse pelo olfato já teria produzido diamantes e outros minérios no meu forno.

A questão das prioridades é realmente determinante: escolher a prioridade errada é fatal para o objetivo almejado.

É necessário aprender a manter o foco para não queimar a pizza.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

Aninha

Aninhar: de ninho

  • v. tr. - pôr em ninho; acolher; agasalhar; esconder;
  • v. int. - fazer ninho;
  • v. refl. - agachar-se; esconder-se;
  • fig. - meter-se na cama.