quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Você sabe que está na Bahia quando...

  • O restaurante do hotel só abre para o café da manhã às 7:30h.

  • A sala de ginástica do hotel só abre às 9:00h.

  • Deus distribui milagres às centenas por minuto, enquanto automóveis, motocicletas, bicicletas e pedestres transitam velozmente pelo caos absoluto das ruas.

  • Apesar da sua irritação, os funcionários do hotel driblam normas internas pra tentar extrair um sorriso da sua cara mal-humorada.

  • Crianças lhe cumprimentam sorrindo e adolescentes prestam, sem medo, a informação que você lhes pediu.

sábado, 22 de novembro de 2008

Classificados

Procura-se um sonho. Que tenha luz, som, forma e calor, desses que aquecem a alma e guiam para um futuro tão querido, mas tão querido, que fazem tudo valer a pena.

O sonho deve ter quatro quartos, tração nas quatro rodas, quatro filhos, quatro horas de carinho todos os dias e som quadrifônico, tapetes e almofadas na sala de música.

Deve ter uma figura central que reúna tudo isso em sua alma, numa etapa preliminar de construção do que será o futuro. Que tenha nos olhos a luz das galáxias, e que saiba fazer mingau de Maizena.

Pago com pacotes de carinho extasiante no corpo e na alma, tigelas de afeto, caixas e caixas de respeito, toneladas de dedicação, cargas de atenção, contêineres de lealdade, carretas de amizade, paletes de proteção, caminhões de fidelidade, vagões de apoio, armazéns de serenidade, barcaças de tolerância e oceanos de um amor que cresce todo dia a ponto de se perder de vista.

O futuro

"É preciso oferecer espaço de sonho"

Gilberto Dimenstein, in "Obama e a ex-futura prostituta de Brasília", Pensata, Folha Online, 15/11/2008.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Primavera de novo

Os dias ficaram mais frios e a casa mais solitária, novamente. Imagino que isso faça parte dos ciclos finais de compreensão e aceitação, mas o retorno de um sentimento que eu já considerava superado é um pouco inquietante.

Redescubro a força da minha ligação e imagino como é que algo tão forte pode ser unilateral. Converso antigas conversas enquanto me desloco pela primavera de Brasília. Ofereço flores, luz, cintilações de chuva e dourados céus de chumbo, querendo que tudo isso fosse teu. Lembro que, se estivesses aqui, sentirias frio.

Claro que tudo tem suas compensações: Victor voltou a telefonar pra mim : ).

Entretanto, não estabeleci nenhuma meta ainda, nada pelo que viver, mesmo após dois arrastados anos de deserto. Moisés deve ter rido até cair da Direita de Deus Pai agora.

Queria tanto que hoje se definisse o meu destino, um bom destino.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Confiança

Quarta-feira, 9 de julho de 2008, 17:29:38
Tycho-1, órbita 19 de Syrrah, constelação de Andrômeda

Sozinhos no meio do deserto inundado de luz, eu e Bam, em forma simbiótica, esperamos.

Uma doce voz nos chama a atenção no alto da colina onde fica o bunker: Bam abre um enorme sorriso ao reconhecer a armadura amarela da sua mãe, que acena lá de cima com uma serenidade que não é sua. Instantaneamente interrompo as cambalhotas de alegria de Bam, gritando na sua mente: “Cuidado! Não é ela!”

Bam para, estarrecido: “É ela, sim, papai. Veja a armadura!” Eu perco o contato. Mas, enquanto Bam escala o morrinho, o chão na face esquerda da colina produz pequenos estalidos e começa a rachar, e ele acha estranho que sua mãe ative uma armadilha de aproximação para ele. E para, olhando para o local das nanogarras e para o sorriso sereno de sua mãe por trás da máscara. Resolve descer, lentamente, de costas. Retomo o contato.

Verificamos que há uma porta de acesso ao bunker, no sopé da colina, e pedimos a ela que abra. A porta emite um clique e abre, mas não há ninguém do outro lado. Do corredor disparamos imediatamente para fora em fuga veloz, Bam no controle.

O local exterior é o Jardim das Mimosoideae, e corremos rua abaixo até encontrarmos um portão aberto. Pela lateral da casa atingimos os fundos, onde um garotinho brinca enquanto sua mãe observa pela janela. Surpresa com a nossa presença, levanta as sobrancelhas, mas a tranqüilizamos: somos Bam e seu pai, vizinhos da casa logo acima. Pedimos permissão para nos escondermos enquanto ligamos para o nosso pai. Ela faz que sim com a cabeça. Colamos no chão e ficamos observando a rua pela fresta do portão, mas ninguém nos seguiu. Dou o comando de voz no telefone: “Pai”. Nesse momento, a dona da casa diz: “Neer”; e eu vejo meu mano chegar ao início da rua na DW4500. Interrompo a ligação pra o Pai e ligo para ele, mas ele não atende. “Barulho da moto, capacete e roupa de couro”, pensei eu. Levanto e grito para ele, deixando a forma simbiótica, mas ele só me vê quando já está estacionando a moto na entrada da nossa casa. Chamo-o urgentemente, e ele desce da moto juntamente com Marg e Boosh (que se apresenta num formato novo) e os três correm na nossa direção.

Relato o que aconteceu, e nos encaminhamos juntos para a casa. Aviso a Bam, que está com os olhos arregalados: “Não é ela”. E ele argumenta: “Mas, papai, é ela, você não viu”? E eu respondo: “Não é ela, filho”. Ele fica quieto e se protege atrás de nós.

Abrimos a porta da frente e entramos. Kalii está nua na sala, andando lentamente de quatro, de forma coleante, com um ar de sensualidade no rosto, que não abandona quando entramos. Aquele olhar vago não combina com sensualidade e nada daquilo combina com o momento, então a imobilizo no chão. Busco sufocá-la com o saco plástico que está em sua cabeça, e ela só percebe a falta de oxigênio muito tempo depois que uma pessoa comum já teria desmaiado. Busco as cicatrizes da cirurgia nos seios, e não as vejo. A pele parece a dela, tem o mesmo brilho, mas é mais clara e muito mais lisa, com microescamas, como o tecido das roupas de natação de última geração.

Onde está Bam? Preciso protegê-lo. Essas pessoas são realmente meus irmãos? Como confiar em alguém, num mundo em que é tão fácil reproduzir outra pessoa ou simplesmente formar uma simbiose com alguém? Em quem confiar? Como testar as pessoas de forma eficiente?