terça-feira, 28 de agosto de 2007

Boa sorte

(Beto Guedes)
O tema da canção
Meu coração guardou
Para dar a quem trouxer
A mensagem dos caminhos
Livres

Viagens de buscar
Sertão e beira-mar
Brincar de bem-me-quer
E uma doce companheira
Sempre

Hoje a noite serenou
Orvalho nos quintais
Acordei pensando em nós
E uma estrela caiu
Lembrei de não chorar
O tempo que passou
Lembrei de desejar
Boa sorte pra você
E o dia clareou


Risadora

Brinquei com o nome dela antes mesmo que ela nascesse: imaginei sua risada todas as manhãs e ri com a surpresa na expressão dela, ao ver seu nome transformar-se em uma outra matéria, com vida própria, um nome com lembranças próprias.

Ela vai embora ao nascer do sol, seguindo seus irmãos. Depois disso o sol e as risadas terão algo em comum; e no quarto escuro não vibrará qualquer som.

Who is Clark?

Meu nome estala. Embora tenha sido um cavalo durante a vida inteira, tenho lembranças de ter sido uma outra coisa, em um outro lugar.

A mesa é fria, a sala é fria, a luz é fria. Um motor zumbe e levanta minha mão, como se não fosse minha.

Minha mente esquadrinha minha mente com um pensamento alheio enquanto novos motores zumbem e dezenas de câmeras estabilizam a massa de plástico e circuitos impressos que se ergue como se não fosse eu.

Meu nome agora estala. Quando eu tinha um nome macio, eu poderia ter sido uma coisa da Humanidade. Isto não é um cavalo. O que será?

Venha cá, rapaz. Deixe-me olhar pra você. Você é um orgulho, mas pecará contra si. Eu o verei muito tempo depois, muitas vidas depois, terra desolada, lamentando sua perda. Nessa ocasião você verá a face da Esfinge e a desvendará através de seu próprio enigma. Você desejará ter estado mais próximo, e a iludirá com a miragem da sua presença.

Lave-se, proteja o menino. Seu tempo passou: é sua vez de se indignar.

sábado, 25 de agosto de 2007

O que há de novo?


Isso: o que há de novo para descobrir? Novos lugares, idéias, seres, ruas, lagos, pessoas, rios, cachoeiras, pratos novos?

Por falar nisso, ontem foi um dia de descoberta: a torta da Famiglia Morelli foi um caminho novo para o Nirvana, e pena que não seja possível comer o suficiente pra chegar lá. Mas é por ali também que se vai.

Hoje é dia de trabalho. Então, larguemos por enquanto o lado light da vida e labutemos nas coisas já descobertas e seguras. O trabalho é uma dádiva e graças a ele também se alcança o paraíso. Ele nos dá a tranquilidade necessária para bem aproveitar a oração, essa ponte entre o Homem e o Cósmico.

Pater noster qui es in coelis, sanctificetur nomen tuum. Adveniat regnum tuum. Fiat voluntas tua sicut in coelo et in terra, quid macroprosopis, quid microprosopis. Panem nostrum quotidianum da nobis hodie et dimmite nobis debita nostra sicut et nos dimmitimus debitoribus nostris. Et ne nos inducas in tentationem sed libera nos a malo.
(Jesus, 0-33 A.D.)

Assim seja!

segunda-feira, 20 de agosto de 2007

Espaços

Assim como acontece com a ausência da luz, os espaços deixados por ela foram preenchidos somente por um nada imenso, semelhante ao mar.

Noto com prazer que novos espaços são criados; lugares que não existiam antes, e que já nascem preenchidos por doçura, ternura, afeto e por uma nova composição muito suave. É um novo trabalho, nova trilha.

Onde vai dar?

terça-feira, 14 de agosto de 2007

Filha

O que ela vai fazer quando acordar? Poderá vir, na ponta dos pés, olhar o meu sono e ficar ali a me olhar, com a respiração contida; poderá entrar embaixo dos meus lençóis e aninhar-se em mim até me acordar com um beijo; ou, moleca, cairá na risada enquanto me faz de cama elástica, esperando que eu a pegue e diga: "ah, é assim? " e a derrube e cubra de beijocas e cócegas, rolando na cama entre declarações de amor.

Ela vai pegar minha mão pra passearmos, trazendo o céu à terra com a voz de fada? Ela vai crescer e ficar a cada dia mais linda, descobrindo o mundo e me obrigando a descobrir-me? Terá um cachorrinho? Aprenderá a nadar? Gostará de jazz? Terá um nome para mim?

Quando ela vier, o planeta nunca mais será o mesmo, e ela há de me ensinar a beleza daquele momento pálido do ocaso, que hoje só vejo através do olhar da sua mãe.

segunda-feira, 6 de agosto de 2007

Trabalho e prazer

Devido à pertinente reclamação feita por Beth ("pra quê viajar tanto?") senti-me obrigado a explicar minha ausência de Brasília e também:

1 - Por quê perdi o espetáculo "Disney Para Piano e Voz", com coreografia assinada por Kaio, que lotou a sala Villa-Lobos do Teatro Nacional por duas noites seguidas, e que eu esperava ansiosamente?

2- Por quê faltei ao encontro da Comunidade dos Apreciadores de Vinho de Brasília, desta vez hospedado na casa de Elizabeth, onde, eu soube, rolou um caldo verde de fazer inveja a qualquer gourmet? e

3 - Por quê declinei do convite pra um chopinho com Mônica pra atualizar assuntos de família?

Ocorre que, pra manter a vida mansa e boa, é preciso trabalhar. Assim, tive de encarar dez dias seguidos de muito frio em SP, mudanças diárias de apartamento e de hotel, alterações de vôo, piqueniques solitários no F1 da 9 de Julho e muito trabalho – este, felizmente, com as pessoas mais bem-humoradas do biz. Fizemos um pusta trabalho de equipe, brainstorm todo dia, reuniões de estratégia, quinhentas revisões de três papers (ih, jargão da moda) e brigas diuturnas com a bendita impressora Xerox Workcentre 415 PRO/420 XL, que é mais complicada do que o nome sugere. Finalmente concluímos o trabalho e chamamos isso de um dia (“called it a day”, entendeu? ^^).

Já viram que foi estimulante, divertido e gratificante. Mas São Paulo não é só trabalho.

Concluída a tarefa do domingo, por volta das 20 horas fomos almoçar um poulet au purée des pommes de terre (ué, resolvi dizer isso em francês; iiiih...) com legumes ao vapor, no Senzalinha. Comi feito uma anta, o que me obrigou a deixar o pesadíssimo equipamento de trabalho no hotel e fazer uma caminhada. Moreover, não achei personne, personne! na internet.

Admito: a idéia da caminhada estava associada a outra idéia, de conhecer um pub irlandês que vi na Peixoto Gomide e cujo nome desisti de tentar lembrar. Assim, fiz a agradável caminhada pela Barão de Capanema, subi a Peixoto e bonk! a cara na porta trancada do desabitado pub. “E agora?”

O jeito foi descer a ladeira de novo em busca de outro lugar potencialmente barulhento e com boa cerveja. Após um curto momento de pânico na Avenida Estados Unidos (não tinha vivalma na rua!), tomei de novo o rumo certo e babei todas as vitrines dos antiquários da Rocha Azevedo, ao ponto de despertar a curiosidade truculenta dos seguranças dos prédios vizinhos. Sem dar pelota aos negões de terno escuro e cara de Apollo Doutrinador, continuei babando as lojas até chegar à Barão de Capanema outra vez, quando o velho sentido de aranha fez bip: - vai por ali!! Contrariando a rebeldia lusa de José Régio, obedientemente percorri a Rio Preto até a Oscar Freire - e zás!, dei de cara com a acolhedora entrada do Santo Grão Café, cheio de gente vestida de preto, com longos cabelos negros e cara de conteúdo.

Sentindo-me em casa, entrei (todo de azul!) no café e refestelei-me (ah, vai dizer que não lembra de "refestelei-me") no confortável bar que separa o discreto e elegante povo de preto do outro povo, mais colorido e menos cabeludo, e que não entrou, ou já saiu, da egotrip de fazer gênero (orra, meu, dava pra fazer um comercial de café do Quartier Latin com o povo de preto. Fiquei esperando Andy Warhol entrar).

Pedi o fantástico café mineiro que ganhou o Cup of The Season de 2006, não sem antes brindar à glória da Criação com uma geladíssima Baden Baden, repleta do sabor cristalino das águas de Campos do Jordão, duas recomendações feitas pela jeune ètoile que, ao me atender, gentil e despretensiosamente me instruiu na cultura nativa.

Saboreei tudo devagar, Cup, Baden, ètoile, aquela música tão indefinível quanto nosotros convivas, a quietude das vozes e os aromas. Finalmente, com o café fechando e eu quase virando abóbora, saí e fiz a caminhada inversa, tendo o cuidado de passar antes pelo Pão de Açúcar e comprar uma caixa de chocolate com menta e outra de chá de cidreira.

Na recepção do hotel, tudo era sossego e good mood. Dividi as mentas com o recepcionista, subi e preparei o chá, antecipando a alegria de viver tudo isso outra vez. O laptop se encarregou de fazer com que eu vivesse três vezes, já que apagou o post inteiro quando eu estava pra concluir. Repeti e curti muito de novo.

sexta-feira, 3 de agosto de 2007

Sweet Hearts

Hoje é um dia de aniversário. Nem tem nada a ver comemorar esse, mas hoje também é sexta-feira; e foi um dia particularmente cansativo no trabalho.

Estou há uma semana em São Paulo, com bagagem suficiente pra apenas dois dias. Os sucessivos adiamentos me impediram até de mandar lavar roupa. Tive que ir ao Carrefour duas vezes pra comprar mais algumas coisas pra vestir; assim, hoje aproveitei pra visitar a bela adega do supermercado, na Pamplona. Lembrei que amanhã tem encontro da comunidade do vinho em Brasília e comprei um vinho espanhol, um Rioja 2004. Bom! Trouxe já aberto pro quarto do hotel, juntamente com (aff) um peso de roquefort, um Brie, uma pera, um saquinho de amendoim, outro de castanhas do ceará e uma caixa de Bon Gouter, que se juntaram à caixa de Polenguinho de ontem pra compor a mesa de jantar mais eclética desta grande metrópole que são as sextas-feiras.

Depois de pegar uma briga feia com a rádio do Skype, que insistia em tocar rock, desisti e abri o Musicovery: não dá pra escolher exatamente o que se quer ouvir, mas é melhor do que rádio bugada.

Um bom banho expulsou meus yah-yahs, e finalmente tá tocando música civilizada na WebRadio. Não que eu não goste de rock: gosto muito mesmo, mas rock tem hora. Agora tá rolando Norah Jones e, em seguida, vai tocar alguma coisa de Diana Krall. Bom!

Sinto falta de pessoas que eu ame. Amar e dar amor é muito muito muito bom!

Pensei em seguir o bom conselho de Ana, que me ligou de Honduras pra me ordenar que eu me divertisse, e ir ao cinema ou a algum pub; mas ficou tarde pro cinema, e que raios eu vou fazer num pub sozinho sem estar nem um pouco a fim de entrar na lengalenga do ignora-rudemente-mas-paquera em que se transformou a humanidade?

Putz! Por falar nisso, lembrei-me da folcloríssima figura Ricardo Tolete, sanfoneiro de Lampião, que, numa noite iluminada diante do glorioso portal do Theatro Santa Roza, há muitas vidas atrás, me cutucou e apontou disfarçadamente pra dois caras que estavam parados a alguns passos de distância, perscrutando a natureza feminina solta na buraqueira da noite paraibana: com vaticínio soberano, o querido Ricardo sanfoneiro disse que tava escrito na testa dos dois primatas, e tava mesmo, "quero comer b*****". Lembrei até do gesto feito com dois dedos e levado até a testa, que ilustrou aquela memorável fala.

(Pronto: Norah resolveu cantar "What Am I to You": a peste tinha que aparecer na minha cômeimouração! Que tipo de animal sem vergonha na cara sou eu? Felizmente fui salvo pelo gongo por um tal Lee Scratch Perry, cantando um reggaezinho jamaicano balançado, "Why People Funny", que trouxe de volta o alto astral. Bom!)

Depois de uma semana de frio incrível, fez sol hoje o dia inteiro na cidade dos paulistas. Liguei o ar condicionado enquanto o rádio subia de novo graças ao baixinho Michel Petrucciani.

Não sei como terminar este post. Na verdade não queria despedir-me do querido diário: gosto de conversar sobre mil amenidades por segundo. Um blog é boa companhia. Abraço!

quinta-feira, 2 de agosto de 2007

Vermelho

Ela tava com sono, às 08:45 a.m.; "preguiçava". O menino foi dormir tarde, ela disse, e ainda tava enfiado no travesseiro. Timidamente me desculpei e me desliguei: "bom dia pra ti, tchau".

O que é essa timidez que parece subserviência? Por quê essa cara no espelho do elevador? Ela me fazia tanto bem; e agora me deixa assim, triste, envergonhado, tímido, infeliz. Falar com ela é bom, mas a ressaca é péssima. Ainda falta administrar isso.