Parece que, afinal, prevaleceu a opinião pública de que lugar de ficha-suja é fora das eleições -- pelo menos numa boa maioria dos casos. Os TREs e o TSE entenderam que a lei aplica-se imediatamente; e o STJ acabou ratificando esse entendimento.
Claro que a ratificação da lei pelo STJ foi difícil. Metade dos ministros acredita, ou parece acreditar, que o estrito respeito à Constituição assegura o bem-estar social e a manutenção do estado de direito. Isso talvez seja verdadeiro em lugares como a Inglaterra ou a Noruega. No Brasil, país com meros 500 anos de idade, cuja cultura colonial foi reforçada por 25 anos de ditadura, a Constituição é regularmente reescrita por velhas oligarquias, com o objetivo de dar a impressão de evolução, mas somente a impressão. Para piorar, é crescente a intervenção do crime organizado sobre a vida política do país e, consequentemente, sobre suas leis, que há décadas são redigidas por gente que frequentou, frequenta ou frequentará o noticiário policial.
Alguns, alçados à mais alta corte do país, comportam-se como se fosse mais necessário manter intocadas essas normas do que atender aos anseios da sociedade por probidade, moralidade e responsabilidade na lide com a coisa pública. Chegam mesmo a criticar a pressão exercida sobre o poder público pela sociedade em busca do respeito a esses princípios universais, como o fez explicitamente o Ministro Gilmar Mendes durante o julgamento do caso Jader Barbalho.
Como boa parte da população brasileira, eu gostaria de sair às ruas, de peito aberto e soprando minha vuvuzela (ainda se vende vuvuzelas?), comemorando essa pequena, rara, mas importante vitória da sociedade sobre os criminosos infiltrados no serviço público. Mas nós, brasileiros, somos gatos escaldados. Sabemos que um número enorme de gente rica, poderosa e de mau caráter pode comprar um número ainda maior de gente sem caráter, egoísta e imediatista que, não por acaso, ocupa posições-chave na administração pública. Não convém comemorar antes que uma vitória definitiva e irretratável demonstre-se cristalinamente.
O recente reforço ao poder de José Sarney no governo federal, por exemplo, deverá criar obstáculos adicionais à plena observância do contrato social. A população brasileira gosta de política mas tem mais o que fazer: gostaria que os tribunais de contas e as câmaras legislativas exercessem sua função de fiscalizar o Erário, e só levanta de seu berço esplêndido quando os servidores públicos extrapolam todos os limites de ganância e irresponsabilidade. Um pouco mais de presença da sociedade na fiscalização faria maravilhas pelo orçamento da República e, por conseguinte, pela saúde, pela segurança e pela educação dos brasileiros, aproximando-nos de ideais de justiça, de administração pública e de bem-estar que temos o direito de almejar.
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