Sou um próspero cidadão emergente, ganho dez mil Reais por mês e tenho uma casa onde morar.
Tenho uma empregada doméstica, à qual pago sete mil Reais de salário por mês. Também pago o seu transporte, alimentação, plano de saúde de primeira linha e moradia e, caso seus trabalhos avancem pela madrugada, o que parece ser muito frequente, ela recebe um adicional.
Apesar disso, a minha casa é imunda, e só insistindo muito consigo que ela faça uma limpeza razoável de vez em quando. Os móveis estão sempre empoeirados e a porta de entrada não tranca mais. Ela fez greve na semana passada e não lavou os pratos nem preparou nenhuma refeição durante oito dias, mas não posso substituí-la por uma funcionária mais dedicada porque ela tem estabilidade no emprego. Ultimamente tem insistido para que eu contrate novos auxiliares para ajudá-la, inclusive uma prima ou duas, sob pena de greve branca.
Ela também é encarregada das minhas compras domésticas, usando o que sobra do meu salário. Traz os recibos do mercadinho que ela mesma escolheu criteriosamente, mas os preços dos produtos sempre me deixam assombrado: uma caixa de fósforos, 120 Reais; um quilo de arroz, 250 Reais; uma dúzia de ovos, 100 Reais; e a continha dela e dos amigos no motel, 400 Reais. O computador do quarto dela, usado para jogar paciência no horário de trabalho, me custou doze mil Reais no cartão de crédito.No próximo ano vou ter que trabalhar um pouco mais, e também precisarei economizar bastante em saúde, segurança e educação, caso contrário não conseguirei bancar o aumento de salário de 61,83% que ela exigiu no apagar das luzes de 2010, além dos pequenos reajustes mensais de praxe que ocorrerão ao longo de 2011.
Tomara que eu tenha saúde ainda por muitos e muitos anos, para poder trabalhar e manter o padrão de vida dela. Afinal, o que seria de mim sem minha empregada?


